A Religião E A Política
Desde sempre que a religião, ou talvez melhor dizendo, a existência ou não, de convicções religiosas em cada pessoa, se tem constituído como factor dinamizador da doutrina, dos princípios e mesmo da acção política desenvolvida pelos partidos. Não será necessário invocar a influência da doutrina social da igreja católica em muitos partidos democrata-cristãos para comprovar isso mesmo.
Porque antes de se ser militante ou simpatizante de determinada formação partidária, é-se cristão (católico, protestante ou ortodoxo), muçulmano, budista, ismaelita, ou pura e simplesmente agnóstico, ou mesmo ateu.
Ora, os partidos são entidades que têm, ou deveriam ter, como objectivo central, segundo o respectivo entendimento de cada um, ajudar a melhorar a vida dos seus compatriotas.
É por isso natural que se detenham sobre as diversas facetas que constituem a vida em sociedade, imbuídos dos valores perfilhados pelos seus membros, e principalmente pelos seus dirigentes, e da sua visão sobre a comunidade. No fundo, que façam repercutir as suas convicções, princípios e valores para as regras que enformam a existência do Estado.
O caso mais recente e fortemente paradigmático das relações estreitas entre religião e política foi o que se prendeu com a atitude do putativo Comissário Europeu Rocco Buttiglione que, consistentemente com as suas convicções religiosas, no caso católicas, defendeu no plano político a tradução desses princípios em que acreditava.
Claro que o pensamento único e politicamente correcto da pretensa aristocracia política europeia logo considerou inadmissível essa conduta, de tal forma que até o intrépido chefe do governo italiano da altura acabaram por fazer vergar.
Mas verdadeiramente, será condenável que os políticos incorporem na sua prática aquilo que são as suas convicções religiosas, ou a sua inexistência? Parece-me que tal não só não é censurável, como o contrário é que seria criticável e revelaria seres neutros, nos quais não tendo a acreditar.
Por exemplo, não competindo ao Estado, na minha opinião, dizer quantos filhos deve ter uma família, ou mesmo se deve ter algum, já considero que é defensável que discrimine positivamente as famílias que, por exemplo, queiram ter mais de x filhos, em nome de princípios, valores e interesses do partido que estiver no Governo.
Igualmente é razoável que questões como o aborto, a eutanásia, o casamento, a adopção e tantos outros assuntos sejam regulados, tendo em conta a existência ou inexistência de convicções religiosas por parte dos políticos e que, portanto, eles perpassem para as regras dos respectivos institutos jurídicos as suas crenças e valores.
Apesar de sustentar que o Estado deve ser laico, estimo como inteiramente legítimo que um partido propugne no Governo propostas que reflictam ideias e posições que tenham nas suas raízes o pensamento católico ou de outras religiões; como também não posso deixar de concordar que, no caso de posições ateias ou agnósticas, elas sejam princípios orientadores da acção política.
É normal que um partido que é composto por pessoas que por sua vez exercem uma determinada função política, para ela transportem aquilo que é o produto da sua vida, nas suas múltiplas vertentes e em particular as suas bases mais profundas de modo de ser e portanto de agir. Até porque se exige aos políticos muito mais do que o mero controlo do défice, a sustentabilidade da segurança social ou a definição de políticas económicas. E mesmo nestas, não deverá ser indiferente a ausência ou existência de convicções religiosas.
Miguel Félix António
Jurista
Porque antes de se ser militante ou simpatizante de determinada formação partidária, é-se cristão (católico, protestante ou ortodoxo), muçulmano, budista, ismaelita, ou pura e simplesmente agnóstico, ou mesmo ateu.
Ora, os partidos são entidades que têm, ou deveriam ter, como objectivo central, segundo o respectivo entendimento de cada um, ajudar a melhorar a vida dos seus compatriotas.
É por isso natural que se detenham sobre as diversas facetas que constituem a vida em sociedade, imbuídos dos valores perfilhados pelos seus membros, e principalmente pelos seus dirigentes, e da sua visão sobre a comunidade. No fundo, que façam repercutir as suas convicções, princípios e valores para as regras que enformam a existência do Estado.
O caso mais recente e fortemente paradigmático das relações estreitas entre religião e política foi o que se prendeu com a atitude do putativo Comissário Europeu Rocco Buttiglione que, consistentemente com as suas convicções religiosas, no caso católicas, defendeu no plano político a tradução desses princípios em que acreditava.
Claro que o pensamento único e politicamente correcto da pretensa aristocracia política europeia logo considerou inadmissível essa conduta, de tal forma que até o intrépido chefe do governo italiano da altura acabaram por fazer vergar.
Mas verdadeiramente, será condenável que os políticos incorporem na sua prática aquilo que são as suas convicções religiosas, ou a sua inexistência? Parece-me que tal não só não é censurável, como o contrário é que seria criticável e revelaria seres neutros, nos quais não tendo a acreditar.
Por exemplo, não competindo ao Estado, na minha opinião, dizer quantos filhos deve ter uma família, ou mesmo se deve ter algum, já considero que é defensável que discrimine positivamente as famílias que, por exemplo, queiram ter mais de x filhos, em nome de princípios, valores e interesses do partido que estiver no Governo.
Igualmente é razoável que questões como o aborto, a eutanásia, o casamento, a adopção e tantos outros assuntos sejam regulados, tendo em conta a existência ou inexistência de convicções religiosas por parte dos políticos e que, portanto, eles perpassem para as regras dos respectivos institutos jurídicos as suas crenças e valores.
Apesar de sustentar que o Estado deve ser laico, estimo como inteiramente legítimo que um partido propugne no Governo propostas que reflictam ideias e posições que tenham nas suas raízes o pensamento católico ou de outras religiões; como também não posso deixar de concordar que, no caso de posições ateias ou agnósticas, elas sejam princípios orientadores da acção política.
É normal que um partido que é composto por pessoas que por sua vez exercem uma determinada função política, para ela transportem aquilo que é o produto da sua vida, nas suas múltiplas vertentes e em particular as suas bases mais profundas de modo de ser e portanto de agir. Até porque se exige aos políticos muito mais do que o mero controlo do défice, a sustentabilidade da segurança social ou a definição de políticas económicas. E mesmo nestas, não deverá ser indiferente a ausência ou existência de convicções religiosas.
Miguel Félix António
Jurista
In Nova Vaga, nº 5
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